Do instigante diálogo entre Peter Seewald e o então Cardeal Joseph Ratzinger, o atual Pontífice Bento XVI, resultou o livro "O Sal da Terra – o Cristianismo e a Igreja Católica no século XXI". Na referida obra, encontramos algumas respostas do Santo Padre para alguns questionamentos do jornalista, o qual abandonara a fé católica havia muito tempo. Certa vez, Seewald lhe perguntou quantos caminhos existiam para Deus, e este afirmou: "Tantos quantos há pessoas".
Abaixo, reproduzimos algumas das perguntas extraídas do livro em questão, em comemoração ao aniversário de Santo Padre, o Papa Bento XVI.
O que o senhor considera mais fascinante em ser católico?
Fascinante é esta história viva, na qual entramos, o que, já em termos humanos, é algo de especial. Fascinante é que uma instituição com tantas fraquezas e falhas humanas se mantenha na sua continuidade e que eu, ao viver essa grande comunidade, possa saber que estou em comunhão com todos os vivos e mortos; e que nela também posso encontrar uma certeza sobre o essencial da minha vida, ou seja, o Deus que está voltando para mim; uma certeza sobre a qual posso fundar minha vida, com a qual posso viver e morrer.
A fé cristã não é uma teoria, mas sim um acontecimento. E isso é muito importante. O essencial, também no próprio Cristo, não é que Ele tenha anunciado determinadas ideias – o que Ele também fez obviamente - , mas eu me torno cristão, porque acredito nesse acontecimento. Deus entrou no mundo e agiu; é portanto, uma ação, uma realidade, não apenas um conjunto de ideias.
Todas as grandes culturas que conhecemos tiveram ou têm a religião como fator comum mais importante. Parece existir uma espécie de uníssomo das doutrinas, por exemplo, na exortação à moderação, na advertência contra o egocentrismo e a autonomia. Então, por que razão as religiões não haveriam de ser todas iguais? Por que razão o Deus dos cristãos haveria de ser melhor do que o Deus do índio? E por que razão haveria de existir uma única religião que levasse à salvação?
Essa proposta, que foi feita desde o início da investigação histórica das religiões no Ilusionismo, mas que também tinha sugerido antes, já é contraditória quando se consideram as próprias religiões. É que não são iguais. Há graus diferentes e há religiões manifestamente doentes, que também podem ser destrutivas para o homem.
A crítica marxista da religião tem razão na medida em que há religiões de práticas religiosas que são alienantes para o homem. Lembremo-nos, por exemplo, de que, na África, a crença nos espíritos ainda continua a ser um grande obstáculo para o desenvolvimento da terra e para a construção de uma estrutura econômica moderna. Se preciso me proteger dos espíritos por todos os lados e se um medo irracional determina todo o meu sentimento de vida, então o que deveria ser a religião certamente não é vivido como deve ser, no mais profundo de mim mesmo. E, assim, também podemos verificar que no cosmos religioso indiano (o nome hinduísmo é, antes de mais nada, uma designação enganadora que engloba uma multiplicidade de religiões) existem formas muito diferentes; algumas muito elevadas, puras, marcadas pela ideia do amor, mas também algumas formas muito cruéis, das quais fazem parte ritos homicidas.
Sabemos que os sacrifícios humanos marcam de forma horrível uma parte da história das religiões; sabemos que a religião política se transformou num instrumento de destruição e de opressão; conhecemos patologias na própria religião cristã. A queima das bruxas é a retomada de um costume germânico que tinha sido superado com dificuldade por meio da evangelização na Alta Idade Média e que depois, na Baixa Idade Media, voltou a surgir com o enfraquecimento da fé. Resumindo: os deuses não são todos iguais, há figuras divinas muito negativas, quer pensemos nos cosmos religioso grego, quer, por exemplo, no indiano. A ideia de igualdade das religiões fracassa, muito simplesmente, perante o fato da história das religiões.
Mas não seria possível aceitar também que alguém possa alcançar a salvação através de outra fé que não a católica?
Isso é uma questão completamente diferente. É perfeitamente possível alguém receber da sua religião as orientações que o ajudam a tornar-se uma pessoa mais pura e, graças às quais, se quisermos usar essa expressão, também agrada a Deus e alcança a salvação. Isso não está, de modo algum, excluído; pelo contrário, acontecerá certamente em grande medida. Só que deduzir daí que as próprias religiões são simplesmente iguais, que estão uma para as outras como num grande concerto, numa grande sinfonia, em que todas, afinal, têm o mesmo significado, isso seria errado.
As religiões também podem tornar mais difícil para o homem ser bom. Isso até pode acontecer no Cristianismo, devido à vivência errada do que é ser cristão, as figuras sectárias, etc. Nessa medida, também a purificação da religião na história das religiões e no cosmos das religiões é sempre uma enorme necessidade, para que não se torne um impedimento para a relação correta com Deus, mas realmente encaminhe o homem.
Eu diria que se o Cristianismo, a partir da figura de Jesus Cristo, se apresentou como verdadeira religião na história das religiões, isso significa que na figura de Cristo surgiu, pela Palavra de Deus, a força realmente purificadora. Não é necessariamente sempre bem vividas pelos cristãos, mas é o critério e a direção das purificações indispensáveis, para que a religião não se torne um sistema de opressão e alienação, mas sim um caminho que conduza o homem a Deus e a si mesmo.
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